Machado de Assis: Feliz ano velho


por Carlos Faraco*
 
Enterro de Machado de Assis

Quando Carolina Novais morreu, em 1904, a vida de Machado de Assis desmoronou.

“Foi-se a melhor parte da minha vida, e aqui estou só no mundo (...). Aqui me fico, por ora, na mesma casa, no mesmo aposento, com os mesmos adornos seus. Tudo me lembra a minha meiga Carolina. Como estou à beira do eterno aposento, não gastarei tempo em recordá-la. Irei vê-la, ela me esperará.”

Para Machado, o “eterno aposento” se abriria quatro anos mais tarde.

O desapego à vida dá agora o tom das cartas de Machado aos amigos:

“Após trinta e cinco anos de casados é um preparo para a morte”. (28 de out 1904)

As únicas coisas que o mantinham vivo eram o carinho dos amigos – tantas vezes expresso em cartas –, o interesse pela literatura e pela Academia Brasileira de Letras, que ajudara a fundar em 1896, e da qual fora eleito presidente primeiro e perpétuo.

“Faço o que posso, mas para mim o trabalho é distração necessária” (05 de jan 1907)

Seu derradeiro romance – Memorial de Aires –, começado em 1907, seria publicado em 1908.

Apesar da serenidade que o escritor aparentava, o prazer de viver tinha mesmo se esvaído com a ausência de Carolina.

Vista fraca, infecção intestinal, uma úlcera na língua.

Em 1 de agosto vai à Academia pela última vez.

Lúcido, recusando a presença de um padre – manteve coerência de quem nunca tinha sido religioso –, Machado morre às 3h e 30min da madrugada do dia 29 de setembro de 1908.

Decreta-se luto oficial no Rio de Janeiro. Seu enterro, com enorme acompanhamento de figuras conhecidas e do povo, atesta a fama que Machado havia alcançado ao lado de Carolina, a quem prometera, no conhecido soneto:

“querida, ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração de companheiro.”



*FARACO, Carlos. Machado de Assis – Um mundo que se mostra por dentro e se esconde por fora. In: ASSIS, Machado de. Histórias sem data. São Paulo: Ática, 1998.


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