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Mostrando postagens de novembro, 2009

Novo projeto editorial para as obras Jorge Amado

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Desde março de 2008 a editora Companhia das Letras tem iniciado a empreitada de reunir numa coleção a obra completa de Jorge Amado. Trata-se de um vigoroso e belo projeto que traz novamente às rodas das discussões literárias a obra do escritor; não que esta alguma vez tenha deixado de ser uma constante entre os leitores, porque o baiano é um dos mais valiosos nomes da nossa literatura e um dos que obtiveram, desde sempre, uma presença constante em diversos universos dentro e fora do Brasil. Jorge Amado nasceu em 10 de agosto de 1912, em Itabuna, na Bahia. Aos dois anos, a família mudou-se para Ilhéus, onde o menino passou a infância e viveu várias experiências que marcariam sua literatura: a vida no mar, o universo da cultura do cacau e as disputas por terra estão entre elas. Começou a escrever profissionalmente como repórter aos catorze anos, em veículos como  Diário da Bahia ,  O Imparcial  e  O Jornal . Na década de 1930 foi para o Rio de Janeiro, onde estudou Direito e

Dois rios que cortam o sertão nordestino

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1. João Cabral de Melo Neto e Graciliano Ramos dispensam apresentação; são dois dos mais importantes nomes de sempre da Literatura Brasileira. E, apesar de autores de duas obras distintas há possibilidade de estabelecer conversas entre as duas. 2.  Principalmente se o leitor lembrar de Morte e vida severina , um poema de verve épica que narra a trajetória do habitante do interior do Sertão nordestino rumo ao centro urbano, e Vidas secas , um romance cuja narrativa se constrói pela retirada não de uma personagem, um Severino, mas de uma família também para o centro urbano. Duas migrações motivadas pela vida escassa nessa região do Brasil; duas migrações perpassadas de uma crítica social muito às claras acerca dos desmandos do poder com os do Nordeste ou uma entrada num dos fossos sociais desse país.  3. Estes e outros aspectos são retomados em duas falas que acontecem amanhã, dia 28 de novembro, a partir das 8h da manhã, no Auditório Central do Campus Avançado Professora Maria

Os desafios de escrever um blogue

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Por Pedro Fernandes Hoje faz exatos dois anos que abri esta página na internet. No fechamento do primeiro ano eu escrevi do interesse meu quando resolvi criar este blogue. Nasceu a ideia meio que por acaso, dizia; tinha o interesse apenas de divulgar um evento na Faculdade; evento em que eu iria ministrar um minicurso sobre a poeta potiguar Auta de Souza. Um blog me permitiria além de divulgar o tal minicurso expor o material produzido e/ou necessário no decorrer dele. Muita coisa publicada dessa ocasião foi deletada, porque como direi mais adiante, e como o leitor tem acompanhado, o blog ganhou outros rumos.  É que permaneci conduzindo seduzido ou viciado pela ideia e achei que este deveria ser o espaço para que eu organizasse minhas leituras que fizesse na web ; então comentaria publicamente por aqui ou traria o texto para cá, claro com as devidas referências. E o propósito durou até certo ponto, quando comecei a postar matérias também minhas: poesia, ensaios, artigos (do

Receita de um poeta

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Emilio Nanni Não nos preocupemos com as palavras Elas caem não sei de onde Vêm de cheio uma após outra A galope ou fugindo do negro de nós E escapam, derrapam, ficam e fincam em versos, por vezes destoados, mas versos. Não faria sentido Ficar sentado, parado, perdido no vácuo do papel A suspirar por donzelas, por outros eus, pelo mundo A esse modo as palavras correm, têm medo de como serão usadas Elas preferem ser abusadas e caírem mortas-vivas, rotas, num verso sem fim. Não há necessidade de arrumá-las como que numa prateleira Elas vêm faceiras, gostam mesmo é da desordem Porque é na liberdade, no caos, que se ergue o sentido Que se mostram coerências, coesões É no desconexo que se ergue o poema. * Acesse  o e-book  Palavras de pedra e cal  e leia outros poemas de Pedro Fernandes.

Butch Cassidy e Sundance Kid, de George Roy Hill

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"Raindrops Keep Fallin' on my Head", cantada por B. J. Thomas no longa, foi uma das músicas mais cultuadas da história do western Este western conta a história, baseada em fatos reais, vivida pelos amigos Butch Cassidy (Paul Newman) e Sundance Kid (Robert Redford) e seu grupo de assaltantes de trens e bancos (Bando do Buraco na Parede), que fogem da polícia por todos os Estados Unidos e depois para a Bolívia. Juntos, eles funcionam como muitas outras duplas: Cassidy é o cérebro, expert em arquitetar planos para conseguir dinheiro ilegal. Sundance é o executor, atira como ninguém. Apesar de foras-da-lei, a dupla conquista a simpatia do público pelo humor. Assim, Roy Hill popularizou a lenda em torno da dupla de criminosos que já era conhecida, mas tornou os bandidos agradáveis ao público (graças também ao poder de sedução dos então galãs Newman e Redford, que retornariam juntos em 1973 em Golpe de Mestre , outro grande sucesso do mesmo diretor). O retrato da

A sangue frio, de Truman Capote

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Por Pedro Fernandes A sangue frio é tradução para o português do original In cold blood do estadunidense Truman Capote. O livro foi publicado em 1966, mas um ano antes da prestigiada revista The New Yorker  adiantou aos leitores o primeiro dos quatro capítulos. Trata-se, em linhas gerais, de um romance que relata o assassinato de uma família de camponeses de Helcomb, interior dos Estados Unidos. O enredo gira em torno de Richard Hickock e Perry Smith que descrevem com certa maestria e em tom adocicado, muito pelo encantamento do escritor pelo caso e os assassinos (principalmente o segundo, com quem, dizem as más línguas, teria tido um envolvimento amoroso) o assassinato de Herb Clutter, Bonnie Clutter, sua esposa, e os seus dois filhos, Kenyon e Nancy. Trata-se de uma obra que marcou a literatura estadunidense porque foi uma das primeiras do chamado rol literatura jornalística, em que o escritor se dedica a contar determinado fato de jornal na forma de romance. De certa ma

José Saramago escreve sobre Lygia Fagundes Telles

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No último mês, o Instituto Moreira Salles deu a conhecer outra edição de sua fabulosa publicação que reúne, num material de altíssima qualidade visual, gráfica e conteudística, dossiês sobre alguns dos nomes mais importantes da nossa literatura. A publicação chama-se  Cadernos de Literatura Brasileira e é apresentada desde 1996, constituindo-se, desde já, em material obrigatório de informação e formação sobre nossos escritores e parte no panorama de nossa memória cultural.   A edição saída agora homenageia a escritora Lygia Fagundes Telles (a jovem mostrada no registro que abre esta postagem). Autora de uma vasta, significativa e bem-desenhada obra, que transita entre o conto e o romance. Sobre sua literatura, Antonio Candido, outro dos nossos expoentes, já disse que tem o mérito de obter "a limpidez adequada a uma visão que penetra e revela, sem recurso a qualquer truque ou traço carregado na linguagem ou na caracterização".  O que me chamou atenção neste núme

Ler o Dom Quixote

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Por Pedro Fernandes Depois de Crime e castigo , de Dostoiévski, essa me foi a obra mais cara à leitura, entretanto, me parece ser essa a característica do clássico: a de marcar seu leitor por todas as vias possíveis, como se a leitura, para ser tida realmente como tal, devesse nos jogar no seu calabouço e de lá nos arrastar aos poucos, trazendo-nos, dessa experiência, carregados de uma nova camada de humanidade agarrada à nossa figura. Como disse certa vez, num texto anterior a este sobre Os sertões , de Euclides da Cunha, renovo aquelas imagens de grande teatro para o clássico de Cervantes. Composto numa época de transição, clara sátira ao fadado romance de cavalaria, entretanto, sem reduzir-se a tanto, O engenhoso fidalgo Dom Quixote de La Mancha nos coloca diante de uma grande arena, que é a Europa medieval povoada de tipos que vão desde o mais popular e picaresco ao sofisticado e grave; Dom Quixote é, sem dúvidas, uma grande aventura da linguagem, conforme entendeu Mich

O poeta que há em Ariano Suassuna

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Ariano Suassuna. Foto de Assis Hoffmann Para muitos, isso deve ser uma novidade. Conhecido mais pelo seu trabalho como dramaturgo pelo já consagrado sucesso O auto da compadecida e por sua produção romanesca com títulos como  A pedra do reino , é necessário dizer que Ariano Suassuna é também poeta. Ainda anônimo, como reconhece o escritor num texto de 2000 para o jornal Folha de São Paulo ; ao comentar acerca do diálogo entre ele e uma leitora, em que ela se apresenta como poeta anônima, Ariano desabafa: “Sou relativamente conhecido como romancista e mais como dramaturgo; como poeta sou ‘anônimo, casual, trágico, inconsequente’ e também ‘fruto e produto do casamento entre a urbanidade e a melancolia de pastos antigos’; pastos esses que, no meu caso, eram povoados de belas cabras agrestes, esquivas, quase selvagens e que pareciam pequenos antílopes, extraviados das savanas da África, das serras do Líbano ou das mesetas da Península Ibérica nos tabuleiros e carrascais dos sertão

Jorge Amado

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Jorge Amado, 1969. No primeiro volume de Cadernos de Lanzarote , publicado no Brasil pela Companhia das Letras, em 1997, são constantes as ocasiões em que José Saramago, Prêmio Nobel da Literatura, o primeiro oferecido a um escritor de língua portuguesa, sobre Jorge Amado. Às vezes, fica a impressão de, além do zelo extremo pelo amigo e pela obra, confessado em outras ocasiões, uma certa ponta de inveja (branca) sobre a vida e a rotina do brasileiro. É que Saramago acompanha os momentos mais intensos da carreira de Jorge, aqueles quando sua obra começou a obter o reconhecimento merecido e, claro, como sempre vem nessas ocasiões, sondou-se até a premiação com o galardão levado pelo português em 1998.  Mas, a vida de Jorge tem outras confluências com a de Saramago; ambos vieram de uma extensa maioria de gente da margem social e, logo, interessados pelos dessa esfera; ambos construíram uma obra única no contexto das produções em língua portuguesa; ambos tiveram posições polít

Dez curiosidades sobre o gênio Heitor Villa-Lobos

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Por Pedro Fernandes O Brasil assinala hoje a passagem dos cinquenta anos sobre a morte de Heitor Villa-Lobos, um dos nossos gênios da música clássica. Ele foi o primeiro a conseguir compor ou dar   um tom  genuinamente brasileiro à música erudita, sempre fechada aos estrangeiros, sobretudo, europeus. E, levei um tempo para conhecer um pouco sobre sua obra; a ocasião onde tudo começou foi um concerto que vi tem uns dois anos de algumas peças suas executadas com flauta. O que fez Villa-Lobos se distanciar da forma oferecida pelos compositores europeus, foi o mesmo exercício que levou os europeus à composição de peças já então clássicas; e nosso compositor demonstrou, desde cedo, a necessidade de buscar naquilo que mais nos definia enquanto identidade brasileira: os ritmos africanos e indígenas. Já década de 1920, quando têm apenas 33 anos, é senhor de seus próprios recursos artísticos, revelados em obras como "A prole do bebê", composto para piano, ou &qu

Dostoiévski para as telas

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Por Manuel da Costa Pinto O Crime e castigo , de Aki Kaurismäki. Dos livros de Dostoiévski, o mais adaptado para o cinema é Crime e castigo , certamente por causa da trama detetivesca e dos diálogos envolventes entre o protagonista Raskolnikov e o juiz de instrução Porfiri Pietróvitch. A trajetória começa com os clássicos homônimos estrelados por Peter Sorre em 1935 (direção de Josef von Sternberg) e Jean Gabin, que na versão francesa dirigida por Georges Lamin em 1956, faz o papel de Porfiri. A lista inclui a versão em desenho animado, feita em 1953 pelo japonês Osamu Tezuka (o mestre dos mangás), e uma adaptação livre, algo maneirista, feita no Brasil pelo diretos Heitor Dhalia e pelo escritor Marçal Aquino: Nina (2004), longa no qual Raskolnikov se transforma na garota desajustada do título (interpretada por Guta Stresser), que vive num quarto de aluguel e é explorada por uma rabujenta senhora (Myrian Muniz). Uma asfixiante versão, que investe menos na trama polic

Crimes e Pecados, de Woody Allen

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O cineasta consegue tocar em assuntos fortes, passando longe do humor, mas sem perder a levez de suas grandes comédias Fanático por Ingmar Bergman, Woody Allen sempre sonhou em fazer dramas profundos na linha do cineasta sueco. A primeira tentativa, não muito convincente, foi com Interiores  (1978), em que deixava de lado a ironia predominantemente em seus trabalhos anteriores. No final da década de 1980, o diretor voltou a se arriscar em territórios bergmanianos e os resultados foram os fracos Setembro  (1987) e A Outra (1988). Mas com Crimes e Pecados  ele acertou no tom: a mistura de drama e humor, em histórias alternadas. De um lado, o correto oftalmologista Judah Rosenthal (Martin Landau) se vê na obrigação de pedir ao próprio irmão que mate sua amante de longa data, Dolores (Anjelica Huston). De outro, Cliff Stern (Allen), um cineasta fracassado obrigado a dirigir um documentário sobre seu cunhado famoso e egocêntrico, Lester (Alan Alda), apaixona-se por uma produtora (Mi

Duas linhas sobre o encontro com Maria Teresa Horta

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Por Pedro Fernandes Eu e a escritora Maria Teresa Horta, Salvador, 2009.  1. Embora soubesse da publicação de vários outros títulos de poesia, pela leitura esparsa na web , conheci o nome de Maria Teresa Horta através de uma fala da professora Conceição Flores em 2007, quando ela se propôs a uma relação intertexto com a obra de outra Teresa, Teresa Orta (leia mais aqui ). 2.  Logo depois da fala de Conceição Flores encontrei a edição das Novas cartas portuguesas  escrita por Maria Velho da Costa e Isabel Barreno. Para quem não conhece este texto, fica a recomendação: as três escritoras planejaram a ideia ainda durante o conturbado período da Ditadura Militar em Portugal e foi publicado em 1972, pela Estúdios Cor. Trata-se de uma reunião de cartas, ensaios, poemas e vários fragmentos dispersos, ora em língua portuguesa ora em língua francesa. A obra é inspirada nas famosas Cartas portuguesas (título francês do século XVII publicado por Claude Barbin); as Cartas  francesa

O grito de Caim por José Saramago

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Por Pedro Fernandes É preciso ser-se Deus para gostar tanto de sangue José Saramago, em "O Evangelho segundo Jesus Cristo" (OESJC), 2006, p.327. Já era de se esperar. E não há novidade alguma no fato. O novo romance de José Saramago, Caim , lançado há poucos dias, recebeu da Igreja o já esperado visto de condenação devido seu teor. Segundo o episcopado lusitano, a nova obra do escritor português não passa de uma operação publicitária e reduz o romancista à categoria de sujeito amante da descordialidade e da ofensa. Depois de insistir na concepção carnal de Jesus, "nascido como todos os filhos dos homens, sujo do mesmo sangue de sua mãe, viscoso de suas mucosidades" (OESJC, 2006, p.65), de uma Maria não virgem, do relacionamento amoroso entre Jesus e Madalena e do que possivelmente esteve envolvido no desfecho da vida de Cristo, Saramago avança sua veia crítica sobre o discurso religioso cristão quando nesse seu novo romance intima o leito

Uma Rua Chamada Pecado, de Elia Kazan

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Adaptação de peça do dramaturgo Tennessee Williams revelou para o cinema talento mítico de Marlon Brando Antes de cinema, Elia Kazan foi um homem de teatro. Desta origem, seus principais filmes herdaram uma admirável direção de atores (por suas mãos passaram os míticos Marlon Brando e James Dean) e a habilidade em reter o essencial da carga dramática, transferindo-a concentrada do palco para a tela. É o que mais chama a atenção no impressionante Uma Rua Chamada Pecado , que tem por base o texto Um Bonde Chamado Desejo , de Tennessee Williams. Como hábito no universo do dramaturgo nascido no Mississipi, os personagens carregam valores fortes e enraizados, e o drama consiste externamente, no confronto entre eles e a sociedade, e, internamente, no conflito moral que acaba por lhes produzir crises psicológicas. É o que acontece a Blanche DuBois (cujo nome ressoa significados de pureza), centro da trama. Ela chega a Nova Orleans vinda do interior, e se hospeda na casa de Stella,