Carlos Drummond de Andrade e a arte de desenhar

“Rabiscar figurinhas sem saber mesmo o que sairá do traço canhestro. Seria ótimo ter nascido caricaturista. Na rua, ao ver desconhecidos, costumo identificá-los: ‘Este foi desenhado pelo Kalixto. Esta é puro J. Carlos. Olha ali a gordona do Raul. Quem inventou esse foi Ziraldo.’ Penso num museu de caricatura, que não sei se existe no exterior, e que eu visitaria sempre, se existisse no Rio.” 

Carlos Drummond de Andrade, “1.º de janeiro de 1976”, O observador no escritório.

 

Edição para os quadrinhos de Robinson Crusoé publicada na Revista Tico e teco, em 1911. Um dos primeiros contatos de Carlos Drummond de Andrade com a arte do desenho foi  com revista.


O poeta Carlos Drummond de Andrade tinha verdadeiro apreço pelo traço do desenho e pelas artes gráficas. Logo cedo, ainda criança teve seu primeiro contato com os traços dos quadrinhos, como a adaptação para os quadrinhos de Robinson Crusoé (foto) que leu aos nove anos e retomaria a personagem comparando-se a ela no poema “Infância”. Parece até ser redundante porque desconheço, pelo que ando a procurar da relação entre escritores e artes plásticas, algum que não tenha tido. E não vou aqui citar nomes. Quem acompanha o Letras verá o que estou falando.

Do apreço pelo desenho, o que mais se conhece do poeta mineiro será as próprias autocaricaturas, muitas publicadas aqui acolá nos seus livros de poesia. Mas, ele também tem uma significativa produção de desenhos. Estive sabendo em matéria publicada na revista Veja de 2009, que a família estava preparando uma edição com toda sua produção artística. Mas, dei uma corrida on-line por esta obra e não encontrei nem sombra.

Carta de Carlos Drummond de Andrade para seu neto Pedro Augusto. Muito dos desenhos que o avô veio descartar no lixo foram resgatados por Pedro.


Tudo lhe vinha como um passatempo. Eram rabiscos que fazia quando falava ao telefone ou nas horas vagas em casa. Mesmo consciente de que não levava jeito para a coisa, muito dos desenhos seus ficaram. Muitos ele descartou. E outros o neto Pedro Augusto (a quem dirigiu o desenho que se vê na ilustração acima) recolheu da lixeira sem que o avô percebesse. Pedro foi quem primeiro chegou a organizar os desenhos de Drummond.

A matéria publicada na Veja atesta que o único conjunto organizado de desenhos do poeta encontra-se na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro: é um caderno com cerca de trinta desenhos, sem identificação e feitos com esferográfica e todos num mesmo dia de 1983 (muitos dos desenhos estão reproduzidos no catálogo abaixo).

Já outra quantidade de desenhos está em mãos de escritores amigos: “A crítica de arte Lélia Coelho Frota ganhou de presente três autocaricaturas e dois retratos dela feitos pelo poeta em papel timbrado do Ministério da Educação, onde trabalhava. No mesmo papel barnabé, o autor traçou quatro desenhos, de frente e de perfil, de Lygia Fagundes Telles, que foram presenteados à amiga escritora.”

Numa das crônicas que escreveu para o Jornal do Brasil chegou a dizer que “o caricaturista é uma pessoa que nos ajuda a viver, manifestando o cômico subjacente no trivial, no grave ou no dramático. Rimos dos outros sem desconfiar que rimos de nós mesmos e da condição humana.”

Na ausência de uma edição com caricaturas (suponho) o Letras elaborou este fôlder com alguns de seus desenhos pescados na web.

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