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Mostrando postagens de maio, 2013

Tudo em excesso é ridículo, o politicamente correto também

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Por Pedro Fernandes Nunca lembro quando foi a primeira vez que me irritei pela tendência mundial do politicamente correto. Mas, vou recuperar uma história que os que me conhecem já terão escutado eu falar a respeito: certa vez, não faz muito tempo, eu tomava meu banho ou fazia alguma coisa no computador, não sei precisar ao certo, ouvi de um grupo de três crianças que brincavam na piscina da casa vizinha onde moro a já conhecida musiquinha do “Atirei o pau no gato”. Uma delas cantou pela letra original – “Atirei o pau no ga-t-o-to/ mas o ga-t-o-to não morreu-reu-reu/ dona Chica-ca admirou-se-se/ do berrô do berrô que o gato deu: - Miau!” Logo em seguida, um dos meninos intervém dizendo que aquela forma de cantar era errada e foi a vez dele fazer a versão adaptada da canção na qual o pobre do animal é privado da surra da dona Chica. Eu fiquei com esse momento na cabeça enquanto pensava comigo mesmo que sempre cantei quando criança a canção pela forma original e nutro desde semp

A datilógrafa, de Régis Roinsard

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É até onde sei o primeiro longa-metragem de Régis Roinsard, que depois de findar seus estudos na prestigiada Ecole Supérieure d’Études Cinématographiques realizou dois curtas – Les petits-salés e Madame Dron – e muitos clipes musicais e spots publicitários. Com cara de comédia romântica a Hollywood, mas a medida adequada em que o bom do gênero em francês ultrapassa, A datilógrafa é um filme divertidíssimo e muito bem desenhado do ponto de vista da construção narrativa. Embora já desde o princípio se estabeleça um possível desfecho para a trama, Roinsard consegue uma proeza rara no cinema do gênero que é compreender o limite do tempo em que as coisas devem de fato acontecer – sem parecer maçante ou está dilatando o tempo para dizer o óbvio. Para justapor numa comparação com o modelo hollywoodiano de fazer comédia romântica (ainda por cima travestida de drama romântico) permita-me alinhar no mesmo nível o filme que deu o Oscar de Melhor Atriz para Jennifer Lawrence este ano, O l

Fernando Pessoa & Ofélia Queiroz – correspondência amorosa completa 1919-1935

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Fernando Pessoa & Ofélia Queiroz  - livro editado pela Capivara Editora em parceria com a Portugal Telecom reúne na íntegra produção epistolar entre o poeta português e sua namorada. Por esses dias comentamos aqui sobre as cartas entre F. Scott Fitzgerald e sua filha; outro dia, fomos às cartas de Charles Darwin; sobre as cartas de Octavio Paz e seu amigo Enrique Krazue; sobre as cartas entre Carlos Drummond de Andrade e muitos intelectuais; e sobre as cartas eróticas de James Joyce a sua mulher; e, como se vê, poderíamos até compor uma coluna aqui (estamos pensando sério sobre) que tivesse esse interesse... Há algo de extrema importância estar às voltas com esse legado dos escritores – podemos dizer com todo sentido que comporta a palavra – e que, vale determinar aqui: é o fato de ser pelas correspondências que se pode esclarecer muito da vida pessoal do seu autor àqueles que tem na biografia seu campo de realização profissional enquanto pesquisadores. Em muitos ca

Mais que escritor, desenhista Millôr Fernandes

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A escrita de Millôr Fernandes é ainda algo por explorar. Não há dúvidas disso – não apenas pelo fato do pouco interesse que há da parte da academia pela sua literatura como pelo modo de escrita pouco usual do escritor. Apesar de textos mais longos, o escritor deixou uma quantidade enorme de coisas miúdas que levará seu tempo para assentar-se como corpus em algum trabalho da parte da crítica, que seja digno de locar Millôr no seu devido lugar da literatura brasileira. Ou não. Talvez o silêncio da academia ou da crítica no geral seja um aviso. Mas Millôr medíocre? Para dizer que a literatura de Millôr não está de um todo esquecida sei de um pesquisador que está decifrando parte das coisas miúdas do escritor reunidas em A bíblia do caos . E o caos é mesmo uma ordem por se decifrar. Que digam os estudiosos do Livro do desassossego , de Fernando Pessoa, obra de igual caoticidade esmiuçada em leituras e releituras e por mais que se estude, parece que não haverá nunca uma forma de

Céline

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Conhecido por um livro, mas autor de uma extensa obra que, como se vê pelo apelo introdutório deste texto, é quase toda desconhecida de nós brasileiros. Ainda bem que  Viagem ao fim da noite , sua epifania literária e um dos seus primeiros textos já tem seu tempo que chegou até nós. E já com esse livro lido não seremos de um todo analfabetos numa das obras que mais influenciaram a narrativa contemporânea. Céline nasceu em 1894 em Courbevoie, zona periférica de Paris. Serviu no exército francês em 1912 e esteve na frente dos conflitos da Primeira Guerra Mundial, onde depois de um acidente, produto de uma arriscada missão de reconhecimento a qual muitos recrutas jovens e inexperientes estavam – podemos dizer – condenados, ele foi mandado de volta para casa com uma condecoração no peito e declarado inválido de guerra. Nesse período do entre guerra, Céline casou e divorciou-se. Depois disso, foi enviado para Londres; e Camarões, na África, para trabalhar numa empresa de extra

Boletim Letras 360º #14

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"Alma de côrno", um dos cinco sonetos inéditos de Fernando Pessoa publicados na Revista Granta  em Portugal. Imagem: Jornal Folha de São Paulo. Semana movimentada na nossa página no Facebook. Alcançamos os 4 000 seguidores e ultrapassamos a marca e, lógico, ficamos muito felizes com  isso. Estamos preparando muitas novidades para o blog – e todas elas levam em consideração esse reconhecimento que vimos alcançando. É tarefa nossa evoluirmos e melhorar, sempre, a qualidade de nossos serviços. Afinal, mais de 4 000 gostam de nós e nós gostamos de muito mais. Agora, um giro pelo que foi notícia por lá nesta semana que finda aqui. Segunda-feira, 20/05 >>> Brasil: Texto inédito de Graciliano Ramos volta-se para a questão do cangaço no Nordeste brasileiro Num texto redigido para o jornal Valor , a professora de Literatura Brasileira da Universidade de São Paulo, pesquisadora da obra de Graciliano Ramos e autora de Graciliano Ramos e a novidade: o a

Conselhos a um aspirante a escritor por Ernest Hemingway

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Em março deste ano ficamos a par de uma correspondência de Oscar Wilde em resposta ao jovem Morgan que lhe pediu alguns conselhos para um aspirante a escritor. Natural. Muitos escritores recebem correspondências do gênero. Algumas é que nunca são respondidas, o que não foi o que aconteceu nesse caso. Wilde, a certa altura da carta alerta sobre o que está nesse campo pantanoso da literatura – “o melhor trabalho na literatura é sempre feito por aqueles que não dependem dela para ganhar seu pão de cada dia”. Estava certo o escritor. Fazer o bem sem olhar a quem parece ser o ditado popular que mais se ajusta a qualquer um que queira ou já esteja nesse território artístico das letras. Nessa mesma situação é que se passa este outro acontecimento. Na primavera de 1934, um jovem que também queria ser escritor pega uma carona e vai à Flórida para conhecer seu ídolo; ninguém menos que Ernest Hemingway. Arnold Samuelson tinha só 22 anos de idade. Morava com os pais no sul da Dakota do

Renoir, de Gilles Bourdos

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Por Pedro Fernandes Michel Bouquet em cena de Renoir . Não é apenas a caracterização que ressuscita o pintor nesse filme, mas o próprio filme é uma pintura de Renoir. Quantos anos são necessários para se formar um grande artista? Aí está uma pergunta cuja resposta é quase impossível de achá-la. A história da humanidade está repleta de nomes que tiveram vida breve e foram gênios, assim como outros que tiveram de esperar muito tempo para alcançar esse lugar, ou ainda uma outra quantidade que jovem ou velho nunca alcançou esse devido espaço entre os imortais. Faz parte desse universo um extenso jogo de possibilidades que não está em nossas mãos conseguir esclarecê-lo assim de um parágrafo para outro. O que é fato é que a grande maioria dos artistas em geral teve de aguardar chegar a morte para de imediato ou tempos depois alcançar o reconhecimento – essa palavra cujo sentido foi sempre raro de tê-lo em vida. No mais, pode-se dizer que a formação de um artista é por toda uma vida.

Arthur Conan Doyle

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O escritor, criador de uma das personagens mais famosas da literatura, nasceu num dia como o de hoje em 1859. Arthur Conan Doyle, ou o pai de todos os detetives – porque foi a graças à personagem que outros autores tiveram inspiração para criar seus detetives, como é caso dentre eles, Hercule Poirot, da Agatha Christie - foi autor de contos, romances e livros espíritas. A criação da personagem mais famosa não foi gratuita. Conta-se que quando ainda era estudante de medicina em Edimburgo, Conan Doyle teve um professor, Joseph Bell, que lhe marcou profundamente. Em suas aulas, Bell ensinava aos alunos a importância de utilizar a observação na hora de fazer um diagnóstico. Para ilustrar esse método, Bell costumava pegar um estranho qualquer e deduzir qual era sua profissão e suas atividades mais recentes. Recém-formado, o jovem médico começou a atender primeiro em Portsmouth, e logo em Londres, mas seu consultório não vivia exatamente cheio. Enquanto esperava seus pacientes, Doy

Autorretrato de escritores

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Um autorretrato de Sylvia Plath; como a poeta estadunidense, muitos foram os escritores que se debruçaram na arte de se autorretratarem. No percurso que vimos fazendo sobre a estreita relação entre os escritores e as artes plásticas fomos colecionando imagens que dizem muito de si próprios: o autorretrato, procedimento, aliás, muito corriqueiro entre os artistas plásticos de fato. O trabalho de se autorretratar é um instante curioso da produção artística humana: é necessário que o eu que retrata exerça um deslocamento sobre seu próprio eixo para ao se enxergar fora de si, enxergar, de fato, a si próprio. É um instante de autorreflexão. O autorretrato é como se fosse a autobiografia tal qual escrita, mas pintada, desenhada, ou rabiscada. Em grande parte, a forma com que este eu deslocado enxerga a si mesmo coincide com o que estamos acostumados a ver nas fotografias – até então, um dos recursos mais apropriados a uma visão mais nítida da imagem do retratado. Reconhecendo-se