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Mostrando postagens de junho, 2015

Mário de Andrade

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Mário de Andrade. Foto: Jorge de Castro Eu sou um escritor difícil  Que a muita gente enquisila, Porém essa culpa é fácil  De se acabar de uma vez: E só tirar a cortina Que entra luz nesta escuridez. Os versos estão no livro A costela do Grão Cão , obra de Mário de Andrade que só veio a lume, apesar de escrito entre 1924 e 1940, em 1941. Eles reforçam duas coisas: uma, o escritor tinha consciência sobre o que durante toda uma vida, e depois dela, sempre o acusaram – o hermetismo de sua obra; outra, estamos diante de um dos nomes mais irreverentes da literatura brasileira. As duas constatações são produzidas como definidoras de um contexto cultural do qual o paulista foi um dos grandes incentivadores: o modernismo cuja chegada é geralmente atribuído a realização da Semana de Arte Moderna de 1992. Noutras palavras é possível dizer que a figura de Mário de Andrade se confunde com aquilo que o movimento preconizava. Antonio Candido relembra-o ao lado de Oswald de A

Número zero, de Umberto Eco

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A história do jornalismo é construída com tanta má informação que é bem possível que não receba como merece a narrativa de Umberto Eco em Número zero . É fácil lembrar da recepção de dois romances que dialogam com o proposto pelo escritor italiano; quando José Saramago publicou Ensaio sobre a lucidez , por exemplo, disseram que o português estaria incentivando o voto em branco como estratégia de dar um golpe na democracia.  Dada a natureza instrumental que muitas vezes têm os jornais para todos os tipos de causa, inclusive as chamadas causas nobres, alguém deve haver tido alguma vez a ideia de criar um periódico não para ser lido pelo público, mas para extorquir os poderes estabelecidos com o propósito de instalar um vazio entre eles (no caso recentemente da mídia brasileira, olhem, não será verdade se a que aí está não é já mestra nisso). Bastam poucos jornalistas devidamente dirigidos e apenas umas dezenas de exemplares para intimidar os destinatários selecionados. Tudo m

Da minha língua vê-se...uma frase na parede

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Por Marina Rufo Spada Saudade só existe pra quem se ama em português. A frase não saiu do meu lápis, infelizmente. Nem todo mundo nasce afortunado assim, para dizer essas coisas... Mas, não me julguem. Aliás, não foi dita, foi lida. Em um muro. Estava lá escrita em uma das ruelas que eu fui cruzando, agora não me lembro onde exatamente; nem quando, tampouco da minha reação quando li – engraçado o que se apaga da mente. Mas esses assuntos de saudade surgem e pairam na gente quando se anda longe, bem longe, dos limites de casa. Foi em um dos meus dias em Coimbra, isso é certo que foi em Portugal. Na verdade, foram dois temas constantes durante meus tempos lá – período vivido em Time in Mind ; Virginia Woolf teria ficado orgulhosa. Aquelas diferenças de idioma, aquelas saudades de sabe-se lá o que, do que ficou, do que vai ficar, de quem vai ficar... Enfim, aquelas pessoas te perguntando o significado de saudade.  Qual, diabos, é o significado de saudade? E por

Boletim Letras 360º #120

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Sem muito saber o que escrever por aqui; só vamos deixar abaixo as notícias que circularam em nossa página no Facebook durante a semana e o motivo deste BO. Bem, esta post foi criada para organizar todas as notícias que publicamos na semana em nossa página no Facebook  J  Assim, a vida não se reduz ao virtual e pela celeridade com que postamos às vezes há coisas que muita gente deixa de ver/ler. Enfim, já estamos na semana 120 desde que criamos a ideia. Segunda-feira, 22/06 >>> Brasil: As últimas correspondências de Machado de Assis Depois de publicados 4 tomos, um trabalho que se iniciou no ano do centenário de morte do escritor (2008) chega ao fim com a publicação de seu último volume. O quinto tomo de Correspondência de Machado de Assis  (Edição Academia Brasileira de Letras) vem a lume em julho e reúne cartas dos derradeiros anos de vida do escritor, de 1905 a 1908. Nesse período, Machado lançou duas obras: Relíquias da casa velha  (1906) e Memorial

Histórias de livros recusados

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Marcel Proust e protagonista do caso de recusa mais famoso de histórias do gênero. O amigo André Gide sequer se deu ao trabalho de ler o primeiro volume de Em busca do tempo perdido  e perdeu a chance de estrear uma das obras fundamentais de todos os tempos. Era um dia gelado de 1996 e Tristan Egolf, descalço, tocava um blues acompanhado com violão, na Pont des Arts de Paris. Uma jovem observou que tinha os pés roxos pelo frio e o convidou para tomar um café. Tristan, entre outras coisas, lhe contou que havia escrito um romance; nos Estados Unidos  o livro havia sido recusado por setenta e quatro editoras. A jovem era Zina Modiano, uma das filhas do escritor galardoado com Prêmio Nobel em 2014, quem depois de ler o manuscrito de Tristan levou-o ao seu pai, menino mimado da Editora Gallimard, que decidiu publicá-lo. O livro se chamava O proprietário do curral (trad. livre a partir do título em espanhol El amo del corral ) e foi um sucesso no mundo inteiro (Egolf se suicida

Não entres tão depressa nessa noite escura, de António Lobo Antunes

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Por Pedro Fernandes Certa vez, Miguel Real, uma das figuras mais lúcidas da crítica literária portuguesa, afirmou que António Lobo Antunes trata-se de um caso singularíssimo e alguém não igualado por ninguém, nem antes e nem na contemporaneidade, no cenário das letras portuguesas; “seus livros revelam uma nova dobra na língua portuguesa, um novo horizonte estético para esta, uma nova forma de combinação de palavras até então nunca descoberta”, diz o crítico. Provam-no a extensa obra romanesca que tem escrito, o exercício da crônica, os mais singulares na literatura em língua portuguesa contemporânea. Muito recentemente, escreveu Caminho como uma casa em chamas , que certamente merecerá atenção por aqui, noutra ocasião. Este texto agora publicado é, no entanto, um conjunto de notas sobre um de seus romances mais conhecidos, e um dos mais densos e mais difíceis também (António Lobo Antunes não escreve para leitores comuns, aliás não escreve para, desafia-os). Não entres tã